sábado, 27 de junho de 2009

Moonwalk Blues: Morre Michael Jackson

Por Geilson Volking





"Que parem os relógios, cale o telefone,
jogue-se ao cão um osso e que não ladre mais,
que emudeça o piano e que o tambor sancione
a vinda do caixão seguido por seu cortejo

Que os aviões, gemendo, acima e em alvoroço,
escrevam contra o céu o anúncio: ele morreu.
Que as pombas guardem luto — um laço no pescoço —
e os guardas usem finas luvas cor-de-breu."



    Senhoras e senhores, Michael Jackson está morto.
    Quando minha esposa me ligou às 19:03 na noite de quinta-feira, dia 25 de junho de 2009, para me lembrar de passar no supermercado e comprar pão e tempero completo, eu não imaginava que ela terminaria seu recado com as seguintes frases:
    — Sim, Gê, sabe quem morreu?
    Arrisquei, óbvio.
    — Gugu Liberato.
    — Não, Michael Jackson.
    Por uma fração de segundo meu cérebro parou. Houve um silêncio do tamanho do Gran Canyon nos meus pensamentos.
    — Morreu?!
    — Foi.
    — Mas... morreu de quê?
    — Sei lá, tá dando no Jornal. Vou desligar pra não acabar meus créditos. Tchau.
    E desligou.
    Fiquei ali então parado debaixo do sinal de trânsito, com uma fatia de limão na língua.
    Impossível! Michael Jackson morreu?! Tanta mulher no mundo e eu fui casar com a mais mentirosa. Só pode ser castigo.
    Ao passar por dois adolescentes, escutei a palavra "Jackson". Bem, poderiam estar falando sobre a Família Jackson. Lembrei de Shakespeare com aquele negócio de mistérios entre o céu e a terra... Liguei o rádio do meu celular e estourou "Ben" lá dentro dos meus ouvidos. Mudei de estação e esbarrei em "Thriller". Dentro da minha barriga as tripas dançavam um break, talvez em homenagem. Foi então que o locutor com voz cavernosa e falsa condolência declarou: "Nossa rádio está de luto. O Jornal Los Angeles Times confirmou agora a pouco a morte do Rei do pop, Michael Jackson". Imediatamente lembrei-me do poema "Funeral Blues", de W. H. Auden, que ficou ecoando na minha cabeça como um maldito refrão de música de axé.
    Michael, Michael..., suspirei profundo, bateu as sapatilhas. Toda a minha infância e adolescência estiveram sob sua influência. Se eu disser que era fã estarei mentindo. Na verdade, acompanhei sua carreira com certa admiração reservada. Admiração que tenho por aqueles que sabem exatamente o que querem e o fazem da melhor forma possível. Ele viveu literalmente toda a sua vida em função do que gostava e literalmente recriou o pop. Hoje, no cenário musical, o que vemos é muita gente fazendo muita coisa parecida. Muita banda que de diferente só tem o nome. Talvez o gênio se destaque por causa disto: eles são únicos, aparecem no mundo e mudam as coisas, fulminam os que acham que tem talento, como o sol que ofusca o brilho das outras estrelas.
    Procuro sempre não confundir a obra com o seu autor. Se ele foi processado várias vezes por variados motivos isso não lhe tira o mérito como artista. É como dizer que Hitler não tinha retórica e espírito de liderança por que cometeu todas aquelas atrocidades na 2° Guerra Mundial. Se ele já não era mais o mesmo da década de oitenta, um dia ele o foi e isso já basta.
    Michael Jackson, um dos maiores astros que já existiu. Um furacão que passou pela Terra. Incontestavelmente, um gênio. Ele era música, dança, técnica, expressão corporal na sua mais alta qualidade (dentro do seu gênero). Um negro pobre que veio do nada e embasbacou o mundo com a sua arte, com a sua criatividade, com o seu brilho. Apesar de fazer parte da indústria cultural é inegável o seu talento e originalidade, por isso tanto sucesso nas mais variadas camadas sociais. Não quero generalizar mas mesmo para aqueles que não gostam dele é quase impossível ficar indiferente a uma apresentação de Michael Jackson. Existia uma força em seus movimentos. A gente fica se perguntando como diabos ele conseguia fazer aquilo; MJ foi um fenômeno ímpar, especial, inimitável, apesar de tantos sósias.
    Num céu carente de grandes estrelas mais uma se apaga. Mas que deixará seu brilho ainda por muito tempo; até quando? Impossível saber.
    Obrigado, Michael, por fazer parte do repertório da minha vida. Das minhas boas memórias de infância e adolescência. Você deixa saudades e uma lacuna enorme como personalidade no cenário musical. Esta é minha pequena homenagem.
    Adeus.